terça-feira, maio 29, 2007

MEMÓRIA: atentado contra a imprensa

Aguardei alguns dias para que a editoria do ‘Imprensa Livre’ pronunciasse algo a respeito da data, 18 de maio de 2007, em que transcorreu o primeiro ano do atentado contra a empresa e os funcionários que lá se encontravam, na madrugada de 18 de maio de 2006. Parece que uma das seqüelas do evento foi a perda da memória jornalística.

Em razão de não aceitar que um crime desse calibre seja esquecido pela sociedade, pelas autoridades policiais, pelos dirigentes municipais e pelo próprio jornal, reproduzo carta da jornalista Raquel Salgado:



Publicada no dia 27 de maio de 2006
Carta aos meus colegas do Imprensa Livre
Raquel Salgado, jornalista


Nestes dias negros, de violência e medo, pelos quais passamos juntos, estamos escrevendo uma página importante na nossa História. Ampliamos a clareza da nossa consciência e o calor da compaixão no nosso coração.Vou começar pelo mais doce – o calor do coração. A solidariedade aos colegas gráficos, que sofreram na pele a violência de que fomos vítima; o companheirismo dos colegas jornalistas, que não pararam de correr atrás das notícias; a persistência dos meninos e meninas da diagramação, da administração e do comercial. Apesar do medo e da insegurança – será que nosso ganha-pão estava ameaçado?

A rapidez e articulação da nossa chefia na denúncia da violência exercida contra um veículo de imprensa. Contra a liberdade de imprensa. A proteção divina que escondeu nosso editor da sanha dos marginais, que chegaram a jogar gasolina no corpo de um dos trabalhadores. O carinho de inúmeros amigos que passaram pela redação, telefonaram, escreveram, se preocuparam. O jeito como trabalhamos naquele dia, tensos mas empenhados em fechar a edição o mais cedo possível para não enfrentar a madrugada. Sem sequer saber se as impressoras voltariam a funcionar depois de terem sido incendiadas.

Que orgulho dessa equipe que não desistiu nem perdeu o rumo por nenhum instante! O jornal não deixou de ser feito nem por uma edição! Até mesmo a edição histórica do dia 18 de maio de 2006 foi entregue aos assinantes. Com atraso de 24 horas, mas foi entregue. Com as bordas queimadas e o carimbo vermelho do DIA D. Não vou me esquecer disto.

Também não esquecerei as marcas de sangue nas calçadas da vizinhança. Sangue do colega que se atirou por uma janela de vidro para fugir da fúria dos invasores. A gente aprende que a imprensa é o “quarto poder”. E o que significa isto? Significa que somos a voz e os olhos que registram os acontecimentos que fazem a História. Damos as informações que formam a Opinião Pública. Somos, enfim, os olhos, a voz e o grito da população. Quando a situação aperta demais, quando nenhuma autoridade resolve o problema, só resta ao cidadão gritar por meio do jornal. É por isto que atentar contra a liberdade de imprensa é um crime tão grave. É por isto que atentar contra o único jornal diário da região é inaceitável. Infelizmente ainda são poucos a perceberem o que isto realmente significa.

Porque fomos atacados? Falaram em crime de conotação política, crime encomendado, interesses contrariados e até em ação do PCC. Talvez nunca saibamos, mas uma coisa é fato: ao nos atacarem, desviaram o foco dos acontecimentos, desviaram nossa atenção – e a de toda a comunidade – do bárbaro crime cometido com a invasão do nosso hospital para a execução de um jovem. Um rapaz que já tinha sido baleado na noite sangrenta da segunda-feira negra - 15 de maio. Ele estava num leito hospitalar, já paraplégico, e foi fuzilado por quatro homens encapuzados e armados. Mas o Imprensa Livre não se dobra. Nem se curva. Nem a imprensa livre.

Tudo isto atiçou ainda mais nosso senso de responsabilidade, nossa energia de repórteres e continuaremos indo atrás das respostas: quem atacou o hospital para executar aquele jovem? Quem é este rapaz que morreu? Porque foi executado desta maneira tão bárbara? Quem são, onde viviam e como estão as famílias de todos os rapazes mortos aqui na região? Quem é o responsável por cada uma destas mortes? Estamos atrás destas respostas!

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